Quando virou a esquina, ainda próximo à sua casa,
encontrou um conhecido, que ao lhe avistar abriu um sorriso e o cumprimentou: “olá,
tudo bem?”.
Antes de responder, pensou consigo mesmo que não, não
estava bem. Não havia conseguido dormir direito aquela noite, por causa de
pensamentos obsessivos sobre tudo que lhe causava medo e angústia nos últimos
tempos.
Refletindo melhor, percebeu que não estava bem desde a
morte de seu pai e lá se iam quase 18 anos. Não falava muito sobre o assunto,
não chorava e nem mesmo tinha sempre consciência do impacto que essa perda causou em sua vida. Mas ela, a falta, estava sempre ali, sempre presente.
Também não estava bem em sua vida profissional, que havia
empacado, justo agora que estava na casa dos 40 anos e precisava de mais
dinheiro para satisfazer algumas necessidades e tornar realidade um ou outro plano.
Sentia-se traído por estar desperdiçando tempo e talento em atividades que já
não lhe traziam prazer.
O prazer, aliás, vinha em conta-gotas e de forma torta,
em risadas histéricas na madrugada, quando estava bêbado, ou comentários cada
vez mais ácidos sobre qualquer pessoa ou fato que o cercasse.
Não se sentia compreendido, amado ou acolhido. E não se
sentia capaz de acolher ou fazer felizes os amigos, os familiares, quem quer
que fosse. Se a felicidade é feita de momentos, a impressão era que sua cota de
sensações boas havia esgotado e, dali em diante, tudo seria apenas apatia.
Por algum motivo que não entendia bem, sentia-se sufocado
e sufocador, vítima e algoz, perseguido e perseguidor. Nada parecia ser capaz
de tirar esse gosto amargo de sua boca. Sabia que, se nada excepcional
ocorresse, havia ainda muita vida pela frente. Mas não conseguia ter certeza se
isso era totalmente bom.
“Tudo ótimo”,
respondeu, retribuindo o sorriso.
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