quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Tudo ótimo

Quando virou a esquina, ainda próximo à sua casa, encontrou um conhecido, que ao lhe avistar abriu um sorriso e o cumprimentou: “olá, tudo bem?”.
Antes de responder, pensou consigo mesmo que não, não estava bem. Não havia conseguido dormir direito aquela noite, por causa de pensamentos obsessivos sobre tudo que lhe causava medo e angústia nos últimos tempos.
Refletindo melhor, percebeu que não estava bem desde a morte de seu pai e lá se iam quase 18 anos. Não falava muito sobre o assunto, não chorava e nem mesmo tinha sempre consciência do impacto que essa perda causou em sua vida. Mas ela, a falta, estava sempre ali, sempre presente.
Também não estava bem em sua vida profissional, que havia empacado, justo agora que estava na casa dos 40 anos e precisava de mais dinheiro para satisfazer algumas necessidades e tornar realidade um ou outro plano. Sentia-se traído por estar desperdiçando tempo e talento em atividades que já não lhe traziam prazer.
O prazer, aliás, vinha em conta-gotas e de forma torta, em risadas histéricas na madrugada, quando estava bêbado, ou comentários cada vez mais ácidos sobre qualquer pessoa ou fato que o cercasse.
Não se sentia compreendido, amado ou acolhido. E não se sentia capaz de acolher ou fazer felizes os amigos, os familiares, quem quer que fosse. Se a felicidade é feita de momentos, a impressão era que sua cota de sensações boas havia esgotado e, dali em diante, tudo seria apenas apatia.
Por algum motivo que não entendia bem, sentia-se sufocado e sufocador, vítima e algoz, perseguido e perseguidor. Nada parecia ser capaz de tirar esse gosto amargo de sua boca. Sabia que, se nada excepcional ocorresse, havia ainda muita vida pela frente. Mas não conseguia ter certeza se isso era totalmente bom.
“Tudo ótimo”, respondeu, retribuindo o sorriso.



Nenhum comentário:

Postar um comentário